Diário da monografia: 14.11.2024

Hoje eu nada fiz. Nem escrevi, até agora. Sequer um poema me passou pela mente. Estive em casa até inda há pouco, mas que proveito? Parece que gastei todo o dia em 2 atividades em essencial: falar com I. e debater-me em pensamentos. A conversa foi curta, mas a elaboração foi longa: mantive o celular em riste por horas na formulação das mensagens mais sinceras. Será mesmo?


(Questionar a si mesmo é como um redemoinho que se vai alargando, até que não restem margens seguras no rio. É minha obrigação, de todo modo, fazê-lo, ainda que aprofunde minha confusão. É triste sentir a perda da amizade, o desinteresse e o distanciamento do amigo.)


Não sei que possa dizer depois disso. Das minhas esperanças para o ano vindouro, da proximidade das férias… Eu queria amar, mas não sei se amo. Não sei se o amor é maior que a inveja e a raiva. Com Ik1, os maus sentimentos se abrandaram. Com Ik2 conservo um laivo de competição devido às nossas ocupações tão semelhantes. Sinceramente, não creio que suplantem o amor. Não fosse assim, tantos artistas colegas não seriam também amigos.

Derramei-me em sentimentos; agora, a espera. Os arroubos de comoção tiveram o mérito de alegrar meu ânimo. É cedo para dar o veredito deste caso. Seria devastador ter de aceitar que um amor morre, que uma amizade tão bonita pode se desfazer. No entanto, quem sabe não sejam alvíssaras do futuro, a profetizar: “tu serás feliz, Bentinho, tu serás feliz…”


E o sentimento de javali nesta universidade? Estar nos últimos dias remete a café frio, águas passadas, rei morto. Este lugar não é mais meu como já foi, não faço parte de seu futuro. Os portões azuis estão se fechando, e vão me jogar num mundo incerto. Ouvi sempre dizer que a UERN é uma mãe; pode ser. É das caridosas, mas põe pra fora os filhos logo chegam à maioridade.

A eclosão do ovo

É bem difícil estar e conviver com o sentimento confuso que é gostar e odiar ao mesmo tempo. É como houvesse algo que nos colocasse próximos, e nos retivesse a estar juntos, e falar sempre com o outro. É como se, se não nos falássemos, fôssemos estragar qualquer coisa de esperança em nós mesmos, nos arrancar um pedaço do futuro que existe por causa do outro. Nós pressentimos esse futuro como ele estivesse envolto em uma casca. Ele parece existir, está lá; estar porém dentro de um envólucro afasta de nós o desfrute mais sincero. Põe a ser uma esperança o desfrute, cerca-o de incerteza e nos deixa zanzar com a ideia de que fosse melhor não ter esse sentimento, não conhecer o outro. Há uma grande dificuldade em eclodir o ovo. E a cada vez que se a sente, é preciso se afastar, pois há o perigo iminente do que há dentro da casca. Talvez seja um bicho que nos devore a nós por completo e sem piedade. Talvez fosse bom que nos devorasse, porque assim nos daria conhecer juntos seu estômago, e lá fosse quente e úmido e tudo que precisássemos. Por enquanto, não existe bicho. Existe um ovo, existe medo. 


Há algo que mim que odeia. Odeia ele. Quer se afastar desse compromisso constante de pensar nele, de manter algo vivo, de fazer existir um bicho vivo que a gente cria junto. Talvez eu pudesse matar esse bicho, deixá-lo morrer, que não é tão importante. Talvez a vida continuasse boa sem ele. Haveria o trabalho, e a faculdade, e os “amigos”, ou a ideia limitada e fantasiosa de um que os conhecidos me permitem construir com alguma ilusão. A solidão é porém certeira. Há um saber não ter ninguém para si, nenhuma dupla, ninguém que se importe com você antes de se lembrar de qualquer outra pessoa. É saber que todos os encontros são interesse, mesmo os mais ingênuos, mesmo os mais bem intencionados interesses. Com ele, não é interesse. Há algo que me põe responsável. Que me põe dentro antes que eu me pergunte o porquê, e antes que surja qualquer resposta inútil em palavras. Estamos juntos na vida. A vida é uma coisa de muitas gentes passeando e procurando pelo mundo. De um vazio, as pessoas se encontram e depois se desencontram como nem existiu o encontro a um tempo. Passam, e procuram e continuam a procura. Ele é como um encontro que não acabou, permaneceu. É uma procura não solitária, é uma consciência onipresente de estar próximo.